Muitas são as discussões acerca da sexualidade, visto ser este um amplo campo de interesse da sociedade e conseqüentemente de médicos, psicólogos, psiquiatras, ou seja, de uma classe profissional que atualmente está incumbida de propiciar curas.
As discussões promovidas pelo meio científico são necessárias para aprimorar constantemente a própria ciência e também as ferramentas usadas como recurso de compreensão e delimitação das doenças, como o DSM e a CID.
É por meio de artigos científicos que se oficializa as investigações e estudos científicos de clínicos e pesquisadores. Escreve-se incansavelmente com o propósito de conter o impulsivo, de classificar o inominável, de disciplinar o excessivamente móvel.
E parece que desde que a sociedade colocou a medicina e a psicologia no lugar de suposto saber, sempre vai haver dificuldade tanto em compreender quanto em delimitar a chamada doença mental, como se pudesse haver a plena sanidade.
quinta-feira, 13 de novembro de 2008
sexta-feira, 3 de outubro de 2008
Aspectos históricos da Classificação Internacional das Doenças – CID
Enquanto as primeiras versões da classificação diziam respeito somente às causas de morte, a partir da Sexta Revisão (CID-6), em 1948, suas finalidades se expandiram passando a incluir doenças não fatais.
A primeira Classificação de Doenças que passou a ter uso internacional foi aprovada em 1893 e, desde então, em intervalos aproximados de dez anos é apresentada e aprovada uma nova revisão. Atualmente está em vigência a 10.ª Revisão (CID-10).
A partir da CID-6, a Organização Mundial da Saúde é responsável pela revisão deste código. Segundo Laurenti:O homossexualismo passou a existir na CID a partir da 6a Revisão (1948), na Categoria 320 Personalidade Patológica, como um dos termos de inclusão da subcategoria 320.6 Desvio Sexual. Manteve-se assim a 7a Revisão (1955), e na 8a Revisão (1965) o homossexualismo saiu da categoria "Personalidade Patológica" ficou na categoria "Desvio e Transtornos Sexuais" (código 302), sendo que a sub-categoria específica passou a 302.0 - Homossexualismo.
A 9a. Revisão (1975) manteve o homossexualismo na mesma categoria e sub-categoria, porém, já levando em conta opiniões divergentes de escolas psiquiátricas, colocou sob o código a seguinte orientação "Codifique a homossexualidade aqui seja ou não a mesma considerada transtorno mental".
Na nona edição da Classificação Internacional de Doenças (CID-9), de 1980, o capítulo “Desordens Mentais” trazia na seção “Desordens neuróticas, desordens de personalidades e outras não-psicóticas” os “Desvios e transtornos sexuais”, que se subdividiam em:
302.0 Homossexualismo
302.1 Bestialidade
302.2 Pedofilia
302.3 Transvestismo
302.4 Exibicionismo
302.5 Transexualismo
302.6 Transtorno de identidade psicossexual
302.7 Frigidez e impotência
302.8 Outros: Fetichismo Masoquismo Sadismo
302.9 Não especificados
Nota-se que não havia distinção entre disfunções sexuais e parafilias ou transtornos sexuais.
Na CID em sua 10.ª revisão (CID-10) já temos os “transtornos da preferência sexual”, incluindo as “parafilias”:
F65.0 Fetichismo
F65.1 Travestismo fetichista
F65.2 Exibicionismo
F65.3 Voyeurismo
F65.4 Pedofilia
F65.5 Sadomasoquismo
F65.6 Transtornos múltiplos da preferência sexual
F65.8 Outros transtornos da preferência sexual
F65.9 Transtorno da preferência sexual, não especificado
A primeira Classificação de Doenças que passou a ter uso internacional foi aprovada em 1893 e, desde então, em intervalos aproximados de dez anos é apresentada e aprovada uma nova revisão. Atualmente está em vigência a 10.ª Revisão (CID-10).
A partir da CID-6, a Organização Mundial da Saúde é responsável pela revisão deste código. Segundo Laurenti:O homossexualismo passou a existir na CID a partir da 6a Revisão (1948), na Categoria 320 Personalidade Patológica, como um dos termos de inclusão da subcategoria 320.6 Desvio Sexual. Manteve-se assim a 7a Revisão (1955), e na 8a Revisão (1965) o homossexualismo saiu da categoria "Personalidade Patológica" ficou na categoria "Desvio e Transtornos Sexuais" (código 302), sendo que a sub-categoria específica passou a 302.0 - Homossexualismo.
A 9a. Revisão (1975) manteve o homossexualismo na mesma categoria e sub-categoria, porém, já levando em conta opiniões divergentes de escolas psiquiátricas, colocou sob o código a seguinte orientação "Codifique a homossexualidade aqui seja ou não a mesma considerada transtorno mental".
Na nona edição da Classificação Internacional de Doenças (CID-9), de 1980, o capítulo “Desordens Mentais” trazia na seção “Desordens neuróticas, desordens de personalidades e outras não-psicóticas” os “Desvios e transtornos sexuais”, que se subdividiam em:
302.0 Homossexualismo
302.1 Bestialidade
302.2 Pedofilia
302.3 Transvestismo
302.4 Exibicionismo
302.5 Transexualismo
302.6 Transtorno de identidade psicossexual
302.7 Frigidez e impotência
302.8 Outros: Fetichismo Masoquismo Sadismo
302.9 Não especificados
Nota-se que não havia distinção entre disfunções sexuais e parafilias ou transtornos sexuais.
Na CID em sua 10.ª revisão (CID-10) já temos os “transtornos da preferência sexual”, incluindo as “parafilias”:
F65.0 Fetichismo
F65.1 Travestismo fetichista
F65.2 Exibicionismo
F65.3 Voyeurismo
F65.4 Pedofilia
F65.5 Sadomasoquismo
F65.6 Transtornos múltiplos da preferência sexual
F65.8 Outros transtornos da preferência sexual
F65.9 Transtorno da preferência sexual, não especificado
Aspectos históricos do Manual Diagnóstico e Estatístico dos transtornos mentais – DSM (transtornos da sexualidade)
A primeira versão do DSM de 1952 colocava as perversões sexuais, os comportamentos psicopatológicos e a homossexualidade no mesmo nível. Na edição de 1958, as perversões eram classificadas como parte dos transtornos de personalidade.
Em 1980, a terceira edição do DSM (DSM-III), substitui o termo perversão por parafilia, retira o diagnóstico de homossexualismo, inclui o de zoofilia, e na categoria de parafilias atípicas, estão: coprofilia, urofilia, necrofilia, escatofilia telefônica, clismafilia.
Na revisão desta edição, feita em 1987 (DSM-III-R), o termo travestismo muda para transvestismo, o diagnóstico de zoofilia é retirado dos itens especificados, e neles entra o frotteurismo, e na categoria das parafilias não-especificadas estão: coprofilia, urofilia, necrofilia, escatofilia telefônica, clismafilia, parcialismo, zoofilia. Nesta revisão, as parafilias tiveram uma divisão entre leve (quando o indivíduo encontra-se acentuadamente perturbado pelos impulsos, mas nunca atuou), moderada (quando o indivíduo atuou ocasionalmente) e grave (quando atuou os impulsos parafílicos com freqüência).
Na quarta edição do DSM (DSM-IV), de 1995, temos o grupo dos “transtornos sexuais e da identidade sexual”, dentro deste, encontram-se os “transtornos sexuais”, e neste as “parafilias”. Nesta edição as mesmas parafilias que ocorrem na edição anterior são especificadas, sendo que ocorrem as seguintes alterações nos itens:
302.02 Pedofilia (acrescentada, em relação à revisão anterior, especificação da atração por menino, menina, ambos; limitada ao incesto, exclusiva ou não)
302.03 Fetichismo com transvestismo (acrescentada, em relação à revisão anterior, especificação de presença ou não de disforia de gênero)
302.9 Parafilias SOE (sem outras especificações)
Os critérios diagnósticos do DSM-IV são, em geral:
A. Ao longo de um período mínimo de 6 meses, fantasias, anseios sexuais e comportamentos sexualmente excitantes recorrentes e intensos, envolvendo o objeto parafílico em questão.
B. As fantasias, anseios ou comportamentos sexuais causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
Segundo o DSM-IV-TR, o conceito de parafilia inclui obrigatoriamente dois critérios:
Critério A: Presença de fantasias, anseios sexuais ou comportamentos recorrentes, intensos e sexualmente excitantes, em geral envolvendo objetos não-humanos, sofrimento ou humilhação próprios ou do parceiro, crianças ou outras pessoas sem o seu consentimento, ocorrendo durante um período mínimo de seis meses.
Critério B: É necessário que tais anseios e/ou fantasias causem sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
Porém, já pela CID-10, as parafilias são incluídas entre os transtornos de preferência sexual e, na descrição de cada tipo, se referem a tendências recorrentes, preferências e dependência de objetos inanimados para obter satisfação sexual, sem referência aos aspectos do Critério B do DSM-IV-TR.
Em 1980, a terceira edição do DSM (DSM-III), substitui o termo perversão por parafilia, retira o diagnóstico de homossexualismo, inclui o de zoofilia, e na categoria de parafilias atípicas, estão: coprofilia, urofilia, necrofilia, escatofilia telefônica, clismafilia.
Na revisão desta edição, feita em 1987 (DSM-III-R), o termo travestismo muda para transvestismo, o diagnóstico de zoofilia é retirado dos itens especificados, e neles entra o frotteurismo, e na categoria das parafilias não-especificadas estão: coprofilia, urofilia, necrofilia, escatofilia telefônica, clismafilia, parcialismo, zoofilia. Nesta revisão, as parafilias tiveram uma divisão entre leve (quando o indivíduo encontra-se acentuadamente perturbado pelos impulsos, mas nunca atuou), moderada (quando o indivíduo atuou ocasionalmente) e grave (quando atuou os impulsos parafílicos com freqüência).
Na quarta edição do DSM (DSM-IV), de 1995, temos o grupo dos “transtornos sexuais e da identidade sexual”, dentro deste, encontram-se os “transtornos sexuais”, e neste as “parafilias”. Nesta edição as mesmas parafilias que ocorrem na edição anterior são especificadas, sendo que ocorrem as seguintes alterações nos itens:
302.02 Pedofilia (acrescentada, em relação à revisão anterior, especificação da atração por menino, menina, ambos; limitada ao incesto, exclusiva ou não)
302.03 Fetichismo com transvestismo (acrescentada, em relação à revisão anterior, especificação de presença ou não de disforia de gênero)
302.9 Parafilias SOE (sem outras especificações)
Os critérios diagnósticos do DSM-IV são, em geral:
A. Ao longo de um período mínimo de 6 meses, fantasias, anseios sexuais e comportamentos sexualmente excitantes recorrentes e intensos, envolvendo o objeto parafílico em questão.
B. As fantasias, anseios ou comportamentos sexuais causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
Segundo o DSM-IV-TR, o conceito de parafilia inclui obrigatoriamente dois critérios:
Critério A: Presença de fantasias, anseios sexuais ou comportamentos recorrentes, intensos e sexualmente excitantes, em geral envolvendo objetos não-humanos, sofrimento ou humilhação próprios ou do parceiro, crianças ou outras pessoas sem o seu consentimento, ocorrendo durante um período mínimo de seis meses.
Critério B: É necessário que tais anseios e/ou fantasias causem sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
Porém, já pela CID-10, as parafilias são incluídas entre os transtornos de preferência sexual e, na descrição de cada tipo, se referem a tendências recorrentes, preferências e dependência de objetos inanimados para obter satisfação sexual, sem referência aos aspectos do Critério B do DSM-IV-TR.
segunda-feira, 15 de setembro de 2008
A escuta analítica - resumo do simpósio de Luis Cláudio Figueiredo no Congresso de Psicopatologia Fundamental de 2008
A escuta analítica acolhe o que a sociedade rejeita, abre espaço para a invasão dos bárbaros, do infantil. A psicanálise se dedica à escuta do infantil, e "infans" é o que não fala, ao menos não fala a língua da civilidade. O paciente é inocente e imaturo (infantil), e por outro lado é voraz e impaciente (bárbaro).
Deve-se abrir espaço para o incomunicável no consultório analítico. O encontro do analista e do paciente dá lugar ao excluído da sociedade e não deixa de sofrer os embates deste momento em sua impetuosidade. Esse encontro se dá às margens da civilização.
Desta forma, a Psicanálise proporciona um encontro inviável, impossível, insatisfatório, mas suficientemente bons, pois o que é ignorado na sociedade, pode ser dito e ouvido na análise.
Deve-se abrir espaço para o incomunicável no consultório analítico. O encontro do analista e do paciente dá lugar ao excluído da sociedade e não deixa de sofrer os embates deste momento em sua impetuosidade. Esse encontro se dá às margens da civilização.
Desta forma, a Psicanálise proporciona um encontro inviável, impossível, insatisfatório, mas suficientemente bons, pois o que é ignorado na sociedade, pode ser dito e ouvido na análise.
sexta-feira, 22 de agosto de 2008
Reflexões acerca do fenômeno da "doença" mental
Influenciados pelos discursos médicos que contaminam a reflexão acerca do fenômeno da "doença" mental, há psicólogos tendentes a obscurecer a escuta clínica do chamado louco e trocar essa escuta por um caminho muito bem propagado e vendido como mais rápido e mais eficaz: o da medicação. E isso é um perigo.
O perigo desta atitude está em contribuir para a manutenção deste ciclo vicioso que investe a psiquiatria e (infelizmente) analogicamente a indústria farmacêutica de um poder que ela não deveria ter, e não deveria pois se empenha para desconstruir a importância das relações sociais e construir a fantasia da solução mágica para as insatisfações do cotidiano, soluções que sabidamente (pelos que fazem e pelos que tomam as drogas que supostamente tratam as supostas doenças mentais) não existe.
Reconhecer que alguns medicamentos possibilitam melhoras na qualidade de vida de algumas pessoas que sofrem da mente, não significa aceitar que tudo o que é vendido como algo que fará bem, realmente fará.
Se não for a Psicologia e a Psicanálise a criticar e se colocar contra esses discursos e posturas nocivas ao estabelecimento dos vínculos interpessoais, maior será a força da indústria farmacêutica, que sob o argumento de ajudar as pessoas, vendem pílulas e ganham fortunas que os capacitam a comprar caráter e índole, opinião e ética de muitos profissionais.
É inaceitável que o investimento em pesquisas que de fato melhorem a qualidade de vida dessas pessoas tenha sido deixado nas mãos de vendedores.
Calar diante disso, é manter esse ciclo de poder nefasto e devastador.
O perigo desta atitude está em contribuir para a manutenção deste ciclo vicioso que investe a psiquiatria e (infelizmente) analogicamente a indústria farmacêutica de um poder que ela não deveria ter, e não deveria pois se empenha para desconstruir a importância das relações sociais e construir a fantasia da solução mágica para as insatisfações do cotidiano, soluções que sabidamente (pelos que fazem e pelos que tomam as drogas que supostamente tratam as supostas doenças mentais) não existe.
Reconhecer que alguns medicamentos possibilitam melhoras na qualidade de vida de algumas pessoas que sofrem da mente, não significa aceitar que tudo o que é vendido como algo que fará bem, realmente fará.
Se não for a Psicologia e a Psicanálise a criticar e se colocar contra esses discursos e posturas nocivas ao estabelecimento dos vínculos interpessoais, maior será a força da indústria farmacêutica, que sob o argumento de ajudar as pessoas, vendem pílulas e ganham fortunas que os capacitam a comprar caráter e índole, opinião e ética de muitos profissionais.
É inaceitável que o investimento em pesquisas que de fato melhorem a qualidade de vida dessas pessoas tenha sido deixado nas mãos de vendedores.
Calar diante disso, é manter esse ciclo de poder nefasto e devastador.
terça-feira, 15 de julho de 2008
Resposta aos pontos nevrálgicos das provocações de Aldo Pereira no texto “Órfãos de Freud”, na Folha de hoje.
É uma inverdade que nenhum psicanalista ousa diagnosticar a histeria atualmente. É sabido que os sintomas histéricos atuais, em geral, não se apresentam mais como as paralisias, as cegueiras e mudezes do final do século XIX, no entanto apresentam-se sob outras formas e com o mesmo diagnóstico, pois diferentemente dos diagnósticos médicos tão minuciosamente descritos nos manuais de doenças mentais, os psicanalíticos não se baseiam nos sintomas, e sim na estrutura psíquica, a saber: neurose (como histeria e neurose obsessiva), psicose (como paranóia e esquizofrenia) e perversão.
Se os complexos e neuroses foram retirados dos Manuais de Doenças Mentais, não significa que houve declínio na formação de psicanalistas e que estes entraram numa corrida pela cientificidade psicanalítica. Houve, certamente profissionais com a lógica cartesiana da ciência exata e mensurável tão incrustrada nos seus valores, que se desesperaram com os discursos que tentavam “atacar” a psicanálise “acusando-a” de ser não-científica, mas houve também profissionais que tranquilamente aceitaram esse lugar de não-ciência, mais próximo da filosofia, que a psicanálise oferece.
Se hoje a medicina tenta injeitar a psicanálise, digo que o mesmo ocorre com a psicanálise em relação à medicina. São incompatíveis e não há nada de errado nisso. A cura pode estar ligada a tantas coisas, inclusive a crenças, sem dúvida.
Quanto à formação do psicanalista, que pode ter qualquer curso superior, inclusive medicina, há tentativas das instituições formadoras idôneas e respeitáveis de se cercar de critérios e cuidados para que se forme um bom psicanalista, mas como em toda área do conhecimento, há boas e más formações, boas e más instituições formadoras, bons e maus alunos, digo em termos de qualidade, nenhum valor moral está implícito aqui.
O tratamento psicanalítico é profundo, pois lida com a estrutura e não com o sintoma, como eu disse anteriormente, então não há como ser algo breve, apesar de termos exemplos descritos em literatura, de brilhantes trabalhos psicanalíticos breves. E considerando que nossas vivências e experiências são uma rede indissociável de fenômenos, é mesmo possível que não se veja perfeitamente, até porque isso não se mensura mesmo, se houve realmente uma influência positiva do analista na vida do analisando, pois este vai mudando vagarosamente de postura frente à vida, em busca da independência e da saúde, a cada experiência transformadora de uma sessão psicanalítica.
A síntese entre a religião e a Psicanálise é algo que não enfurece os psicanalistas, como poderia enfurecer a alguns cientistas, talvez pela Psicanálise não ser ciência, pelo contrário, é um fenômeno digno de ser estudado, pois chama a atenção.
Outro dia mesmo estava eu pensando que o dízimo pago pelos fiéis se aproxima, mutatis mutandi, dos honorários pagos ao analista, no aspecto de pagar um profissional em quem você confia e que está te auxiliando numa cura, pois é inegável que os fiéis que crêem no poder do pastor, saiam do encontro mudados para melhor, ou até curados. Há alguns antropólogos que explicaram isso, xamanismo, válido também para a psicanálise, sem dúvida, e pra muitos outros postos de poder.
Se os complexos e neuroses foram retirados dos Manuais de Doenças Mentais, não significa que houve declínio na formação de psicanalistas e que estes entraram numa corrida pela cientificidade psicanalítica. Houve, certamente profissionais com a lógica cartesiana da ciência exata e mensurável tão incrustrada nos seus valores, que se desesperaram com os discursos que tentavam “atacar” a psicanálise “acusando-a” de ser não-científica, mas houve também profissionais que tranquilamente aceitaram esse lugar de não-ciência, mais próximo da filosofia, que a psicanálise oferece.
Se hoje a medicina tenta injeitar a psicanálise, digo que o mesmo ocorre com a psicanálise em relação à medicina. São incompatíveis e não há nada de errado nisso. A cura pode estar ligada a tantas coisas, inclusive a crenças, sem dúvida.
Quanto à formação do psicanalista, que pode ter qualquer curso superior, inclusive medicina, há tentativas das instituições formadoras idôneas e respeitáveis de se cercar de critérios e cuidados para que se forme um bom psicanalista, mas como em toda área do conhecimento, há boas e más formações, boas e más instituições formadoras, bons e maus alunos, digo em termos de qualidade, nenhum valor moral está implícito aqui.
O tratamento psicanalítico é profundo, pois lida com a estrutura e não com o sintoma, como eu disse anteriormente, então não há como ser algo breve, apesar de termos exemplos descritos em literatura, de brilhantes trabalhos psicanalíticos breves. E considerando que nossas vivências e experiências são uma rede indissociável de fenômenos, é mesmo possível que não se veja perfeitamente, até porque isso não se mensura mesmo, se houve realmente uma influência positiva do analista na vida do analisando, pois este vai mudando vagarosamente de postura frente à vida, em busca da independência e da saúde, a cada experiência transformadora de uma sessão psicanalítica.
A síntese entre a religião e a Psicanálise é algo que não enfurece os psicanalistas, como poderia enfurecer a alguns cientistas, talvez pela Psicanálise não ser ciência, pelo contrário, é um fenômeno digno de ser estudado, pois chama a atenção.
Outro dia mesmo estava eu pensando que o dízimo pago pelos fiéis se aproxima, mutatis mutandi, dos honorários pagos ao analista, no aspecto de pagar um profissional em quem você confia e que está te auxiliando numa cura, pois é inegável que os fiéis que crêem no poder do pastor, saiam do encontro mudados para melhor, ou até curados. Há alguns antropólogos que explicaram isso, xamanismo, válido também para a psicanálise, sem dúvida, e pra muitos outros postos de poder.
quinta-feira, 3 de julho de 2008
A perversão
A psicanalista e historiadora (que bela combinação de saberes!) Elisabeth Roudinesco deve estar a essa hora falando sobre Perversão na sexta edição da Festa Literária Internacional de Paraty. É um tema que urge.
Os atos perversos que ocorrem na sociedade chamam a atenção de toda a população, não só porque são comportamentos que fogem à norma, mas também por tangenciarem aspectos que estão presentes em cada um de nós, as pulsões destrutivas, perversas.
No entanto é interessante que se mantenha a idéia da diferença entre a pessoa que pratica o ato perverso e aquela que sente-se indignada com isso, pois é nessa diferença que se estrutura a existência da civilização. Mais especificamente, é na possibilidade de controle das pulsões que está a diferença entre civilização e barbárie.
Os atos perversos que ocorrem na sociedade chamam a atenção de toda a população, não só porque são comportamentos que fogem à norma, mas também por tangenciarem aspectos que estão presentes em cada um de nós, as pulsões destrutivas, perversas.
No entanto é interessante que se mantenha a idéia da diferença entre a pessoa que pratica o ato perverso e aquela que sente-se indignada com isso, pois é nessa diferença que se estrutura a existência da civilização. Mais especificamente, é na possibilidade de controle das pulsões que está a diferença entre civilização e barbárie.
terça-feira, 1 de julho de 2008
Desvios sexuais: aspectos históricos
Krafft-Ebing, um psiquiatra alemão, foi o primeiro autor a descrever de maneira sistemática sobre os transtornos relacionados à sexualidade humana em 1886, e juntamente com Havellock Ellis e Moll, considerava como perversa toda ativação do instinto sexual que não fosse voltada à reprodução e segundo ele, o transtorno existe quando o comportamento sexual é excessivo e perigoso para o indivíduo, ou quando o impulso sexual se torna excessivo e exclusivo, causando sofrimento. Essa concepção de transtorno sexual permanece até os dias atuais.
O autor W P de Silva salienta que foi só na segunda metade do século XIX que as variações sexuais começaram a ser extensivamente discutidas na literatura clínica.
No início do século XX temos uma obra de referência indiscutível em 1905, ‘Três ensaios sobre a teoria da sexualidade’, de Freud, onde no primeiro ensaio, de título ‘as aberrações sexuais’, ele critica a opinião popular e científica da época segundo as quais a homossexualidade e outras perversões teriam uma causa orgânica constitutiva ou seriam resultado de uma degeneração mental. Neste texto, Freud cita diversas vezes os sexólogos da época, como Krafft-Ebing e Havelock Ellis, e ineditamente relaciona a sexualidade desviante da sexualidade dita ‘normal’ quando:
- Aproxima a homossexualidade à heterossexualidade introduzindo a idéia da ‘bissexualidade inata’, que seria a coexistência de tendências femininas e masculinas na infância de todo indivíduo, ou seja, uma predisposição de todo ser humano à bissexualidade.
- Aproxima a perversão à meta sexual genital quando desvenda a sexualidade infantil e toma toda criança como um ‘perverso polimorfo’, ou seja, as partes do corpo da criança são altamente erotizadas, e segundo o autor, um adulto perverso seria aquele que permaneceu fixado a um desses componentes parciais da sexualidade infantil.
Na segunda metade do século XX, Kinsey teve fundamental importância nessa discussão, pois até a publicação de ‘O comportamento sexual do homem’ em 1948, considerava-se natural somente a heterossexualidade e o estímulo exclusivo dos órgãos genitais na relação sexual. A revelação de Kinsey sobre a ocorrência de diversas práticas sexuais entre os americanos, influenciou intensamente o meio científico, e as discussões se acirraram acerca dos limites entre normalidade e patologia sexual.
Percebe-se então que sempre houve uma preocupação da sociedade acerca da sexualidade e das diferentes formas como ela se apresenta nas pessoas, e o desejo de agrupar as pessoas de acordo com a semelhança de seus comportamentos. Isso se refletiu na medicina psiquiátrica que se mantém atenta às diferentes manifestações comportamentais dentro da sociedade, e proporciona uma ampla, constante e dinâmica discussão para encontrar melhores formas de abordar a doença. Dessas discussões, surge a necessidade de concentrar em um manual aquilo o que se estipulou como parâmetros entre a normalidade e a patologia, e estes também têm mudado, assim como a sociedade.
O autor W P de Silva salienta que foi só na segunda metade do século XIX que as variações sexuais começaram a ser extensivamente discutidas na literatura clínica.
No início do século XX temos uma obra de referência indiscutível em 1905, ‘Três ensaios sobre a teoria da sexualidade’, de Freud, onde no primeiro ensaio, de título ‘as aberrações sexuais’, ele critica a opinião popular e científica da época segundo as quais a homossexualidade e outras perversões teriam uma causa orgânica constitutiva ou seriam resultado de uma degeneração mental. Neste texto, Freud cita diversas vezes os sexólogos da época, como Krafft-Ebing e Havelock Ellis, e ineditamente relaciona a sexualidade desviante da sexualidade dita ‘normal’ quando:
- Aproxima a homossexualidade à heterossexualidade introduzindo a idéia da ‘bissexualidade inata’, que seria a coexistência de tendências femininas e masculinas na infância de todo indivíduo, ou seja, uma predisposição de todo ser humano à bissexualidade.
- Aproxima a perversão à meta sexual genital quando desvenda a sexualidade infantil e toma toda criança como um ‘perverso polimorfo’, ou seja, as partes do corpo da criança são altamente erotizadas, e segundo o autor, um adulto perverso seria aquele que permaneceu fixado a um desses componentes parciais da sexualidade infantil.
Na segunda metade do século XX, Kinsey teve fundamental importância nessa discussão, pois até a publicação de ‘O comportamento sexual do homem’ em 1948, considerava-se natural somente a heterossexualidade e o estímulo exclusivo dos órgãos genitais na relação sexual. A revelação de Kinsey sobre a ocorrência de diversas práticas sexuais entre os americanos, influenciou intensamente o meio científico, e as discussões se acirraram acerca dos limites entre normalidade e patologia sexual.
Percebe-se então que sempre houve uma preocupação da sociedade acerca da sexualidade e das diferentes formas como ela se apresenta nas pessoas, e o desejo de agrupar as pessoas de acordo com a semelhança de seus comportamentos. Isso se refletiu na medicina psiquiátrica que se mantém atenta às diferentes manifestações comportamentais dentro da sociedade, e proporciona uma ampla, constante e dinâmica discussão para encontrar melhores formas de abordar a doença. Dessas discussões, surge a necessidade de concentrar em um manual aquilo o que se estipulou como parâmetros entre a normalidade e a patologia, e estes também têm mudado, assim como a sociedade.
sexta-feira, 13 de junho de 2008
Evolução do conceito de desvio sexual no DSM
A primeira versão do DSM - O Manual Diagnóstico e Estatístico das Doenças Mentais, de 1952 colocava as perversões sexuais, os comportamentos psicopatológicos e a homossexualidade no mesmo nível. Na edição de 1958, as perversões eram classificadas como parte dos transtornos de personalidade.
Em 1980, a terceira edição do DSM (DSM-III), substitui o termo perversão por parafilia, retira o diagnóstico de homossexualismo, inclui o de zoofilia, e na categoria de parafilias atípicas, estão: coprofilia, urofilia, necrofilia, escatofilia telefônica, clismafilia.
Na revisão desta edição, feita em 1987 (DSM-III-R), o termo travestismo muda para transvestismo, o diagnóstico de zoofilia é retirado dos itens especificados, e neles entra o frotteurismo, e na categoria das parafilias não-especificadas estão: coprofilia, urofilia, necrofilia, escatofilia telefônica, clismafilia, parcialismo, zoofilia. Nesta revisão, as parafilias tiveram uma divisão entre leve (quando o indivíduo encontra-se acentuadamente perturbado pelos impulsos, mas nunca atuou), moderada (quando o indivíduo atuou ocasionalmente) e grave (quando atuou os impulsos parafílicos com freqüência).
Na quarta edição do DSM (DSM IV), de 1995, temos o grupo dos “transtornos sexuais e da identidade sexual”, dentro deste, encontram-se os “transtornos sexuais”, e neste as “parafilias”. Nesta edição as mesmas parafilias que ocorrem na edição anterior são especificadas, sendo que ocorrem as seguintes alterações nos itens:
302.02 Pedofilia (acrescentada, em relação à revisão anterior, especificação da atração por menino, menina, ambos; limitada ao incesto, exclusiva ou não)
302.03 Fetichismo com transvestismo (acrescentada, em relação à revisão anterior, especificação de presença ou não de disforia de gênero)
302.9 Parafilias SOE (sem outras especificações)
Desde 1980 o DSM não sofreu alterações muito significativas.
Em 1980, a terceira edição do DSM (DSM-III), substitui o termo perversão por parafilia, retira o diagnóstico de homossexualismo, inclui o de zoofilia, e na categoria de parafilias atípicas, estão: coprofilia, urofilia, necrofilia, escatofilia telefônica, clismafilia.
Na revisão desta edição, feita em 1987 (DSM-III-R), o termo travestismo muda para transvestismo, o diagnóstico de zoofilia é retirado dos itens especificados, e neles entra o frotteurismo, e na categoria das parafilias não-especificadas estão: coprofilia, urofilia, necrofilia, escatofilia telefônica, clismafilia, parcialismo, zoofilia. Nesta revisão, as parafilias tiveram uma divisão entre leve (quando o indivíduo encontra-se acentuadamente perturbado pelos impulsos, mas nunca atuou), moderada (quando o indivíduo atuou ocasionalmente) e grave (quando atuou os impulsos parafílicos com freqüência).
Na quarta edição do DSM (DSM IV), de 1995, temos o grupo dos “transtornos sexuais e da identidade sexual”, dentro deste, encontram-se os “transtornos sexuais”, e neste as “parafilias”. Nesta edição as mesmas parafilias que ocorrem na edição anterior são especificadas, sendo que ocorrem as seguintes alterações nos itens:
302.02 Pedofilia (acrescentada, em relação à revisão anterior, especificação da atração por menino, menina, ambos; limitada ao incesto, exclusiva ou não)
302.03 Fetichismo com transvestismo (acrescentada, em relação à revisão anterior, especificação de presença ou não de disforia de gênero)
302.9 Parafilias SOE (sem outras especificações)
Desde 1980 o DSM não sofreu alterações muito significativas.
terça-feira, 3 de junho de 2008
Perversão x parafilia
Ao longo da história, a medicina procurou estabelecer quais comportamentos são considerados normais e quais não são, inclusive as práticas sexuais. Esses parâmetros médicos mudam através dos tempos, ou seja, tanto pode ocorrer que uma prática sexual que antes era considerada pela medicina como desviante da norma, seja hoje aceita como normal, como o que era visto como normal, passe a ser encarado como desviante.
Há um livro de 1886 - Psychopathia Sexualis, onde o autor Krafft-Ebing, médico e neurologista alemão, considerava como perversa toda ativação do instinto sexual que não correspondesse à voltada à reprodução e que haveria transtorno quando o comportamento sexual fosse excessivo e perigoso para o indivíduo, ou quando o impulso sexual se tornasse excessivo, exclusivo e causasse sofrimento. Essa idéia perdura até os dias atuais, com a diferença que a medicina não chama mais de perversão os comportamentos sexuais que fogem à norma (se considerarmos norma o ato sexual voltado à reprodução) e sim parafilia (DSM-IV, 1994) ou transtorno de preferência sexual (CID X, 1993).
Há um livro de 1886 - Psychopathia Sexualis, onde o autor Krafft-Ebing, médico e neurologista alemão, considerava como perversa toda ativação do instinto sexual que não correspondesse à voltada à reprodução e que haveria transtorno quando o comportamento sexual fosse excessivo e perigoso para o indivíduo, ou quando o impulso sexual se tornasse excessivo, exclusivo e causasse sofrimento. Essa idéia perdura até os dias atuais, com a diferença que a medicina não chama mais de perversão os comportamentos sexuais que fogem à norma (se considerarmos norma o ato sexual voltado à reprodução) e sim parafilia (DSM-IV, 1994) ou transtorno de preferência sexual (CID X, 1993).
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