Um filme de François Ozon, adaptado da peça de Juan Mayorga, dramaturgo, matemático e professor de filosofia espanhol, "El chico de la última fila".
Os personagens principais são o professor de francês e literatura francesa Germain (Fabrice Luchini), sua esposa curadora de uma galeria de artes Jeanne (Kristin Scott Thomas), Raphael Artole pai (Denis Mènochet), Raphael Artole filho (Bastien Ughetto) e Esther Artole (Emmanuelle Seigner) - a família de classe média, e Claude Garcia (Ernst Umhauer) - o aluno da última fila.
O Liceu Gustave Flaubert, a casa dos Artole, a casa de Germain e Jeanne, e a galeria de artes Labirinto do Minotauro são os cenários principais.
Germain é nitidamente um professor entediado com seu cotidiano, dizendo que passou as férias lendo Schopenhauer e reclamando para a esposa que pegou a pior das classes para lecionar.
Algo de curioso é a tarefa que Germain passa aos seus alunos, ele pede que os adolescentes de 16 anos descrevam 48 horas de seus fins de semana, o que sugere um aspecto voyeurista de Germain, e é com enorme satisfação que dentre uma pilha de redações sem conteúdo algum, Germain lê a descrição de Claude sobre seu fim de semana na casa dos Artole.
Claude Garcia consegue a atenção e desperta a curiosidade de Germain não só com sua audaciosa descrição dos costumes provincianos da família de classe média, mas também com a instigante palavra ao final da redação: continua...
Germain, sob o apelo do professor, do maestro, incita Claude a melhorar sua escrita, ganhar estilo, desejando sempre mais dos cada vez mais bem escritos capítulos realistas de seu aluno. Claude, por sua vez, segue à risca as orientações do professor de quem recebe livros emprestados de sua biblioteca particular em troca de mais capítulos. Ocorre aqui uma espécie de relação de servidão, ou de sadomasoquismo em que ora Claude é achincalhado com as críticas mordazes de seu algoz e mantém-se satisfazendo-o com sua escrita, ora Germain é criticado profundamente nas narrativas de Claude e se mantém fiel leitor da novela de seu aluno.
Uma certa perversão perpassa todo o filme, seja pelos olhares voyeurs de Claude dirigidos à mãe de Rapha, e depois à mulher de Germain, seja pela relação quase incestuosa que vai se criando entre os amigos-irmãos Claude e Rapha, seja pela relação incestuosa-sado-masoquista entre Germain e Claude, ou ainda pela presença simbolicamente incestuosa no nome de pai e filho.
Em dado momento, Claude revela que escolhera Rapha para entrar em sua casa pois notara que na saída do colégio, os pais de Rapha sempre o esperavam de mãos dadas... E aí desdobra-se a razão pela qual Claude desenvolve este interesse pela vida do colega... Não fosse pelo prazer que o colorido da vida dos outros dá a Claude, ele teria a triste rotina de levantar, pôr seu uniforme, tirar o pai paraplégico da cama e colocá-lo em sua cadeira de rodas, e seguir o dia de forma completamente enfadonha e difícil.
Em meio a tudo isso, Germaine vai à galeria onde sua esposa expõe trabalhos com o tema "a ditadura do sexo", sexo que Germaine e Jeanne param de fazer quando se entretêm com os capítulos de Claude, direcionando sua libido para esta atividade escopofílica... sexo que Esther faz sem nenhum gosto com Raphael pai, exemplificando momentos em que seja na presença ou ausência do sexo, ele parece não ter sentido nem em um nem em outro casal.
Os casais Jeanne-Germain e Esther-Raphael pai movem-se de formas diferentes com a presença de Claude, mas assim como um filho suscita diferentes movimentos quando se põe entre diferentes tipos de pais.
A quarta perede teatral se faz presente ao encerrar de cortinas final...
Afinal... a literatura, o cinema, o teatro, as séries de TV, as fofocas, entre poucas outras coisas, cumprem também a função de servir de meios para estar dentro de outras casas, espiar buracos de fechaduras, ser o mosquito em meio a diálogos... O voyeurismo surge desde o momento infantil em que queremos saber o que ocorre entre as quatro paredes do quarto para onde nossos pais vão sozinhos todas as noites...