quinta-feira, 25 de abril de 2013

Reflexões sobre a homossexualidade - Entrevista




        1 - De que forma você acredita que o desenquadre nosológico da OMS 1975 afetou os homossexuais? (Souza, Miriam Isabel de. Ed. 2002). 
A história mostra que a homossexualidade já foi e ainda é encarada de diversas maneiras dependendo da época e do grupo social em que ocorre, ora tendo um caráter natural dentro da cultura, ora sendo reprovada.
Penso que o desenquadre nosológico da OMS que retirou o homossexualismo (nomenclatura utilizada à época) da lista internacional de doenças em 1975, é uma conquista importante de uma antiga luta de muitos grupos sociais de homossexuais que já tinham se organizado para defender uma posição social que não os inferiorizasse ou discriminasse, mas não foi a culminação desse processo, pois muito ainda teve que ser e ainda há que se elaborar socialmente para que as pessoas de inclinação homoafetiva possam deixar de sofrer discriminação.
O desenquadre nosológico afetou as pessoas de inclinação homoafetiva certamente não no sentido de que só então elas deixaram de ser discriminadas, porque não foi isso que ocorreu, mas no sentido de certificar que seu posicionamento social forte e organizado pode influenciar organizações que exercem um poder de ditar parâmetros de normalidade / doença, a ponto de movê-los a se reposicionar.

            2 - Você concorda com a resolução CFP 01/99 de 22/03/1999 da questão da orientação sexual?
Art. 3° - os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados. Por quê? ( Souza, Miriam Isabel de. Ed. 2002).
Concordo. Pois não há sentido algum em alguém, sobretudo o psicólogo, favorecer a patologização de algo que não é patológico; e também não faz sentido coagir alguém a se tratar sem que ele solicite tratamento, muito menos para algo que não precisa ser tratado (eliminado).
O que ocorre é que muitos psicólogos que têm em sua vida privada posicionamentos discriminatórios em relação a práticas homoafetivas ou homoeróticas acabam por deixar que isso atravesse o momento terapêutico de forma nociva, tentando forçar algo que o paciente não solicitou, não precisa nem deseja. Então o órgão que rege a profissão, neste caso do Conselho Federal de Psicologia, deve fazer o papel de parametrizar o papel do profissional.
Claro que exatamente pelo fato de a sociedade ainda não ter uma opinião homogênea de aceitação e naturalização da homossexualidade, muitos homossexuais vêm aos consultórios às vezes querendo eliminar o desejo homoafetivo de suas vidas, e muitas vezes é preciso um trabalho muito cuidadoso tornar o próprio sujeito capaz de discernir se o que ele quer não é fugir de seu próprio desejo para satisfazer o desejo de seu meio social.

          3 - Em segundo lugar constatava-se a dificuldade dos clientes de falarem do homossexualismo dizendo que era ela os homens, que de fato reprimiam. Embasado neste texto você acredita que hoje ainda há tão forte repressão como a que Freud descreve? (Costa, Jurandir Freire. Ed. 1995).
Dependendo do contexo social, pode haver maior ou menor repressão em relação à homossexualidade, pois um dos fatores determinantes da repressão é a aceitação social. O que é reprimido são conteúdos inaceitáveis ou indesejáveis para a consciência, e esta se forma através da interação com o contexto social, da relação entre indivíduo e grupos sociais, sejam estes a família, a escola, a igreja, os amigos, etc.
Pode-se dizer que há menos motivos para repressão de conteúdos psíquicos que remetam a desejos homoafetivos hoje em dia, pois a homoafetividade é mais aceita socialmente, no entanto não se pode generalizar isso, pois, como já foi dito anteriormente, muitos contextos sociais ainda discriminam essa inclinação, produzindo nos sujeitos que a têm um conflito que torna necessária sua repressão em seus psiquismos.
                                   
I           4 - Ainda utilizando as informações da questão acima.
Quais os danos psicológicos causados pela repressão? (Costa, Jurandir Freire. Ed. 1995).
É através da repressão, entre outros processos psíquicos, que se dão os sintomas, ou seja, um sintoma é ocasionado pela repressão, sendo um substituto de uma satisfação pulsional.
A repressão é um mecanismo que deve existir para que possamos viver em sociedade, pois se satisfizéssemos todas as nossas exigências e desejos inconscientes, haveria muitos conflitos interpessoais. A repressão serve para conter certos impulsos e também conteúdos que são conflitivos para o indivíduo, no entanto esse mecanismo não é de todo eficiente e a energia não descarregada numa satisfação libidinal gerará sintomas psíquicos ou corporais, que são muitas vezes danosos.
Os danos produzidos por esse mecanismo podem ser de ordem psicossomática, conversiva, etc.

5 - Segundo Navarro-Swain, para Freud, a sexualidade normal seguiria um caminho evolutivo em fases: Anal, oral, genital, da infância ao estagio adulto. Se há uma pausa significativa nesse crescimento, isso designaria um desvio ou fixação anormal em estágios anteriores à sexualidade adulta. Assim, os/as homossexuais estariam vivendo uma fase anterior ao pleno desenvolvimento sexual. O que você poderia me dizer referente a esta afirmação? (Navarro-Swain, Tania).
        Freud assumiu diversas posturas diante do tema da homossexualidade em sua vasta obra teórica, e se fôssemos comparar cada uma, encontraríamos até alguns pontos contraditórios, pois Freud mudou muito sua teoria ao longo do tempo, mantendo muitos pontos e modificando tantos outros.
          No que diz respeito à homossexualidade, Freud nos “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, tece considerações sobre a bissexualidade inata, afirmando que nascemos com uma tendência à bissexualidade e ao longo de nosso desenvolvimento, ou a heterossexualidade ou a homossexualidade será reprimida. Essa repressão ocorrerá conforme o código moral de cada local e época.
            E em 1935, Freud respondendo a uma mãe norte-americana que pede auxílio sobre seu filho, diz:
“Eu creio compreender após ler sua carta que seu filho é homossexual. Eu fiquei muito surpreso pelo fato de que a senhora não mencionou esse termo nas informações que deu sobre ele. Posso eu, vos perguntar por que evitou esta palavra? A homossexualidade não é evidentemente uma vantagem, mas não há nada do que sentir vergonha. Ela não é nem um vício, nem uma desonra e não poderíamos qualificá-la de doença. (...) Muitos indivíduos altamente respeitáveis, nos tempos antigos e modernos foram homossexuais (Platão, Michelângelo, Leonardo da Vinci, etc). É uma grande injustiça perseguir a homossexualidade como crime e também uma crueldade.” (Freud, 1935/1967, p.43).

          6 -  Freud usava o substantivo homossexual conforme linguagem corrente admitindo nitidamente a crença na existência de uma personalidade ou identidade homossexual teoricamente não problemática. Com base nessa afirmação você pode dizer qual é a visão da psicanalise atualmente? (Costa, Jurandir Freire. Ed. 1995).
É exatamente essa: a homossexualidade não é um “problema”, a não ser que o homossexual julgue-a ser um “problema”. Neste último caso, o fator determinante desse parecer é frequentemente a dificuldade em encontrar aceitação social.

7 - Ainda utilizando os dados da questão acima, o homossexual é uma personalidade ou faz parte da personalidade? (Costa, Jurandir Freire. Ed. 1995).
            Nem uma coisa nem outra, necessariamente... Mas estaria mais correto pensar que o desejo por uma pessoa do mesmo gênero pode fazer parte da personalidade de uma pessoa.

     8 - Segundo o Livro Orientação Sexual em algumas culturas à pratica homossexual não implica na homossexualidade, tanto que após uma determinada idade o homem se casa com uma mulher. Que consequências esta ação pode trazer psicologicamente a um individuo?
            Tudo depende do código moral e das construções identitárias sociais de cada época e lugar. Essa prática pode ser completamente bem aceita num dado local e época e não gerar absolutamente conflito psíquico algum, conflito esse que pode surgir se for imposto como regra e o indivíduo não desejar isto.
           
              
           9 -  De fato, nenhuma das teorias existentes sobre as causas de Homossexualidade nos convence e a nossa tendência é de tratá-las todas, sem exceção, como produções ideológicas. (Peter Fry, Edward MacRae).
Você concorda com esta afirmação? Por quê?
Sim, pois sempre será uma explicação que reflete as concepções de uma época e um lugar, além do que uma ideologia se presta a uma espécie de dominação, e isso no seguinte sentido: o fato de se propor a explicar ou encontrar causas para algo como o comportamento e o desejo homoafetivo é em si uma tentativa de fazer uso de um argumento para atuar sobre a homossexualidade, ou seja, de exercer um poder sobre um indivíduo ou grupo a partir de uma ideia muitas vezes falaciosa e perniciosa.



Um comentário:

Anônimo disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.