No texto "Três ensaios sobre a teoria da sexualidade" de 1905, Capítulo I – "As aberrações sexuais", no tópico "Desvios com respeito ao alvo sexual" Freud fala que "mesmo no processo sexual mais normal reconhecem-se os rudimentos daquilo que, se desenvolvido, levaria às aberrações descritas como perversões." (p.40)
E ao fazer considerações gerais sobre as perversões, fala: "Em nenhuma pessoa sadia falta algum acréscimo ao alvo sexual normal que se possa chamar de perverso, e essa universalidade basta, por si só, para mostrar quão imprópria é a utilização reprobatória da palavra perversão. Justamente no campo da vida sexual é que se tropeça com dificuldades peculiares e realmente insolúveis, no momento, quando se quer traçar uma fronteira nítida entre o que é mera variação dentro da amplitude do fisiológico e o que constitui sintomas patológicos. Ainda assim, em muitas dessas perversões a qualidade do novo alvo sexual é de tal ordem que requer uma apreciação especial. Algumas delas afastam-se tanto do normal em seu conteúdo que não podemos deixar de declará-las "patológicas", sobretudo nos casos em que a pulsão sexual realiza obras assombrosas (lamber excrementos, abusar de cadáveres) na superação das resistências (vergonha, asco, horror ou dor)."(p.52-53)
Sobre a dificuldade em se traçar a divisória entre o normal e o patológico Freud diz: "Na maioria dos casos podemos encontrar o caráter patológico da perversão, não no conteúdo do novo alvo sexual, mas em sua relação com a normalidade. Quando a perversão não se apresenta ao lado do alvo e do objeto sexuais normais, nos casos em que a situação é propícia a promovê-la e há circunstâncias desfavoráveis impedindo a normalidade, mas antes suplanta e substitui o normal em todas as circunstâncias, ou seja, quando há nela as características de exclusividade e fixação, então nos vemos autorizados, na maioria das vezes, a julgá-la como um sintoma patológico."(p.53)
Contribuindo para a discussão o Psicólogo; psicanalista; Doutor em Psicopatologia Fundamental Paulo Roberto Ceccarelli diz "...mais do que discutir a normalidade ou a patologia de determinada expressão da sexualidade, o que interessa é determinar os movimentos pulsionais e os processos identificatórios que levaram a construção daquela dinâmica psicossexual particular." in Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, São Paulo, III, 3, 18-37, set. 2000
"... as manifestações da sexualidade, tanto as "normais" quanto aquelas que fogem à norma, devem ser compreendidas não como problemas mas, antes, como soluções." Paulo Roberto Ceccarelli in Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, São Paulo, III, 3, 18-37, set. 2000
"Dispondo-se a escutar um sujeito que fala de seu sofrimento, de suas paixões, de seu pathos, a Psicopatologia Fundamental transforma a narrativa do sujeito. Por não ocupar o lugar do orthos, do correto, da ortodoxia, a Psicopatologia Fundamental vai especificar uma posição teórico-clínica que se propõe, baseada na ruptura freudiana, "criar" uma psicopatologia própria para cada sujeito que lhe permita transformar em experiência as manifestações de seu pathos." Paulo Roberto Ceccarelli in Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, São Paulo, III, 3, 18-37, set. 2000
"Na clínica, o sexual dos Ideais pode produzir efeitos perversos. Os complexos inconscientes infantis, que a transferência reatualiza, correm sempre o risco de provocar, entre analista e analisando, a instalação desta forma de sexual. Enquanto a sexualidade pré-genital, genital, ou ainda perversa, é facilmente detectável, o sexual sem nome que os Ideais evocam pode fazer com que o sujeito, num narcisismo mortífero, entregue-se de corpo e alma ao gozo suposto do outro que o analista encarna, levando-o a renunciar as modificações que conseguiu, graças à análise, para manter este lugar imaginário. A essência do trabalho analítico é a de descobrir, em cada caso, o procedimento adequado para que este tipo de sexual, ao invés de conduzir à uma nova forma de alienação, transforme-se numa força ativa que permita o sujeito fazer o luto das identificações. Quanto ao analista, cuja escuta não é imune a seus próprios complexos inconscientes e à sua própria organização identificatória, ele não está ao abrigo desta forma do sexual." Paulo Roberto Ceccarelli. "SEXUALIDADE E PRECONCEITO" in Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, São Paulo, III, 3, 18-37, set. 2000
"...a perversão pode ser considerada uma chave interpretativa de numerosos processos sociais da atualidade."(...) "processos psíquicos até agora exclusivos à perversão enquanto patologia passam a ter presença cada vez maior na cultura." In "A recodificação pós-moderna da perversão." de Nelson da Silva Junior e Daniel Rodrigues Lirio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário