1 - De que
forma você acredita que o desenquadre nosológico da OMS 1975 afetou os homossexuais? (Souza,
Miriam Isabel de. Ed. 2002).
A história mostra que a homossexualidade
já foi e ainda é encarada de diversas maneiras dependendo da época e do grupo
social em que ocorre, ora tendo um caráter natural dentro da cultura, ora sendo
reprovada.
Penso que o desenquadre nosológico
da OMS que retirou o homossexualismo (nomenclatura utilizada à época) da lista
internacional de doenças em 1975, é uma conquista importante de uma antiga luta
de muitos grupos sociais de homossexuais que já tinham se organizado para
defender uma posição social que não os inferiorizasse ou discriminasse, mas não
foi a culminação desse processo, pois muito ainda teve que ser e ainda há que
se elaborar socialmente para que as pessoas de inclinação homoafetiva possam
deixar de sofrer discriminação.
O desenquadre nosológico afetou as
pessoas de inclinação homoafetiva certamente não no sentido de que só então elas
deixaram de ser discriminadas, porque não foi isso que ocorreu, mas no sentido
de certificar que seu posicionamento social forte e organizado pode influenciar
organizações que exercem um poder de ditar parâmetros de normalidade / doença,
a ponto de movê-los a se reposicionar.
2 - Você
concorda com a resolução CFP 01/99 de 22/03/1999 da questão da orientação
sexual?
Art. 3° - os psicólogos não
exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou
práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar
homossexuais para tratamentos não solicitados. Por quê? ( Souza, Miriam Isabel
de. Ed. 2002).
Concordo. Pois não há sentido algum
em alguém, sobretudo o psicólogo, favorecer a patologização de algo que não é
patológico; e também não faz sentido coagir alguém a se tratar sem que ele solicite
tratamento, muito menos para algo que não precisa ser tratado (eliminado).
O que ocorre é que muitos
psicólogos que têm em sua vida privada posicionamentos discriminatórios em
relação a práticas homoafetivas ou homoeróticas acabam por deixar que isso
atravesse o momento terapêutico de forma nociva, tentando forçar algo que o
paciente não solicitou, não precisa nem deseja. Então o órgão que rege a
profissão, neste caso do Conselho Federal de Psicologia, deve fazer o papel de
parametrizar o papel do profissional.
Claro que exatamente pelo fato de a
sociedade ainda não ter uma opinião homogênea de aceitação e naturalização da
homossexualidade, muitos homossexuais vêm aos consultórios às vezes querendo
eliminar o desejo homoafetivo de suas vidas, e muitas vezes é preciso um
trabalho muito cuidadoso tornar o próprio sujeito capaz de discernir se o que
ele quer não é fugir de seu próprio desejo para satisfazer o desejo de seu meio
social.
3 - Em
segundo lugar constatava-se a dificuldade dos clientes de falarem do
homossexualismo dizendo que era ela os homens, que de fato reprimiam. Embasado
neste texto você acredita que hoje ainda há tão forte repressão como a que
Freud descreve? (Costa, Jurandir Freire. Ed. 1995).
Dependendo do contexo social, pode
haver maior ou menor repressão em relação à homossexualidade, pois um dos
fatores determinantes da repressão é a aceitação social. O que é reprimido são
conteúdos inaceitáveis ou indesejáveis para a consciência, e esta se forma
através da interação com o contexto social, da relação entre indivíduo e grupos
sociais, sejam estes a família, a escola, a igreja, os amigos, etc.
Pode-se dizer que há menos motivos
para repressão de conteúdos psíquicos que remetam a desejos homoafetivos hoje
em dia, pois a homoafetividade é mais aceita socialmente, no entanto não se
pode generalizar isso, pois, como já foi dito anteriormente, muitos contextos
sociais ainda discriminam essa inclinação, produzindo nos sujeitos que a têm um
conflito que torna necessária sua repressão em seus psiquismos.
I 4 - Ainda
utilizando as informações da questão acima.
Quais os danos psicológicos
causados pela repressão? (Costa, Jurandir Freire. Ed. 1995).
É através da repressão, entre
outros processos psíquicos, que se dão os sintomas, ou seja, um sintoma é
ocasionado pela repressão, sendo um substituto de uma satisfação pulsional.
A repressão é um mecanismo que deve
existir para que possamos viver em sociedade, pois se satisfizéssemos todas as
nossas exigências e desejos inconscientes, haveria muitos conflitos
interpessoais. A repressão serve para conter certos impulsos e também conteúdos
que são conflitivos para o indivíduo, no entanto esse mecanismo não é de todo
eficiente e a energia não descarregada numa satisfação libidinal gerará
sintomas psíquicos ou corporais, que são muitas vezes danosos.
Os danos produzidos por esse
mecanismo podem ser de ordem psicossomática, conversiva, etc.
5 - Segundo
Navarro-Swain, para Freud, a sexualidade normal seguiria um caminho evolutivo
em fases: Anal, oral, genital, da infância ao estagio adulto. Se há uma pausa
significativa nesse crescimento, isso designaria um desvio ou fixação anormal
em estágios anteriores à sexualidade adulta. Assim, os/as homossexuais estariam
vivendo uma fase anterior ao pleno desenvolvimento sexual. O que você poderia
me dizer referente a esta afirmação? (Navarro-Swain, Tania).
Freud assumiu diversas posturas
diante do tema da homossexualidade em sua vasta obra teórica, e se fôssemos
comparar cada uma, encontraríamos até alguns pontos contraditórios, pois Freud
mudou muito sua teoria ao longo do tempo, mantendo muitos pontos e modificando
tantos outros.
No que diz respeito à
homossexualidade, Freud nos “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, tece
considerações sobre a bissexualidade inata, afirmando que nascemos com uma
tendência à bissexualidade e ao longo de nosso desenvolvimento, ou a heterossexualidade
ou a homossexualidade será reprimida. Essa repressão ocorrerá conforme o código
moral de cada local e época.
E em 1935, Freud respondendo a uma
mãe norte-americana que pede auxílio sobre seu filho, diz:
“Eu creio compreender após ler sua
carta que seu filho é homossexual. Eu fiquei muito surpreso pelo fato de que a
senhora não mencionou esse termo nas informações que deu sobre ele. Posso eu,
vos perguntar por que evitou esta palavra? A homossexualidade não é
evidentemente uma vantagem, mas não há nada do que sentir vergonha. Ela não é
nem um vício, nem uma desonra e não poderíamos qualificá-la de doença. (...)
Muitos indivíduos altamente respeitáveis, nos tempos antigos e modernos foram
homossexuais (Platão, Michelângelo, Leonardo da Vinci, etc). É uma grande
injustiça perseguir a homossexualidade como crime e também uma crueldade.”
(Freud, 1935/1967, p.43).
6 - Freud
usava o substantivo homossexual conforme linguagem corrente admitindo
nitidamente a crença na existência de uma personalidade ou identidade
homossexual teoricamente não problemática. Com base nessa afirmação você pode
dizer qual é a visão da psicanalise atualmente? (Costa, Jurandir Freire. Ed.
1995).
É exatamente essa: a
homossexualidade não é um “problema”, a não ser que o homossexual julgue-a ser
um “problema”. Neste último caso, o fator determinante desse parecer é
frequentemente a dificuldade em encontrar aceitação social.
7 - Ainda
utilizando os dados da questão acima, o homossexual é uma personalidade ou faz
parte da personalidade? (Costa, Jurandir Freire. Ed. 1995).
Nem uma coisa nem outra,
necessariamente... Mas estaria mais correto pensar que o desejo por uma pessoa
do mesmo gênero pode fazer parte da personalidade de uma pessoa.
8 - Segundo o
Livro Orientação Sexual em algumas culturas à pratica homossexual não implica
na homossexualidade, tanto que após uma determinada idade o homem se casa com
uma mulher. Que consequências esta ação pode trazer psicologicamente a um
individuo?
Tudo depende do código moral e das
construções identitárias sociais de cada época e lugar. Essa prática pode ser
completamente bem aceita num dado local e época e não gerar absolutamente
conflito psíquico algum, conflito esse que pode surgir se for imposto como
regra e o indivíduo não desejar isto.
9 - De fato, nenhuma das teorias existentes sobre as causas de
Homossexualidade nos convence e a nossa tendência é de tratá-las todas, sem
exceção, como produções ideológicas. (Peter Fry, Edward MacRae).
Você concorda com esta afirmação?
Por quê?
Sim, pois sempre será uma
explicação que reflete as concepções de uma época e um lugar, além do que uma
ideologia se presta a uma espécie de dominação, e isso no seguinte sentido: o
fato de se propor a explicar ou encontrar causas para algo como o comportamento
e o desejo homoafetivo é em si uma tentativa de fazer uso de um argumento para
atuar sobre a homossexualidade, ou seja, de exercer um poder sobre um indivíduo
ou grupo a partir de uma ideia muitas vezes falaciosa e perniciosa.