Pois não é que às vezes sinto-me, lá em minha poltrona, detrás do divã, fazendo poesia...
E não é pelas belas palavras (não se diz poeta aquele que emite belas palavras?) que sim, às vezes até saem, mas é pela coisa de tentar pôr em palavras o pensamento, de tentar tocar o outro com a palavra dita, como se eu pudesse dizer a mais perfeita tradução do que pensei e do que o outro pode compreender, e com isso entrar no universo do outro, fazer parte, transformá-lo. Não será este o anseio do poeta?
A palavra sai tentando se fazer entender, mas sempre falta, sempre deixa brechas... uma ausência que acaba sendo preenchida com sentimentos, lembranças... Porque no que se diz sempre está contido o que não foi dito e nosso desejo completa o dito com o não dito, tampa buracos. Tampa? É de buracos que somos feitos. Não pode ficar o dito pelo não dito, há que se insistir, fazer disso tarefa contínua do dizer-se. Nesse sentido o poeta faz algo muito diferente do analista, o primeiro deixa muitos não ditos, o segundo precisa tudo dizer.
Na incontinência da palavra
ficam buracos,
fica o não dito,
o sentido,
sentimento buscando sentido,
direção,
descarga de libido.
O sonho é uma poesia que ainda está no pensamento, boiando... E no exato momento em que a gente conta um sonho, a imagem, o pensamento, a sensação ganham um tanto de sentido, mas noutro tanto se perdem, viram fumaça. A palavra não pode conter o sonho. Nem a poesia. [talvez]Só a análise.